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Taxa associativa - Obrigatoriedade do pagamento?
O Tema 492 do STF definiu, com repercussão geral, critérios vinculantes para a cobrança de taxas de manutenção e conservação por associações em loteamentos de o controlado, regrado pelo art. 36-A da lei 6.766/1979.
O debate sobre essa matéria sempre foi muito intenso visto que havia grande conflito entre o princípio do enriquecimento ilícito (art. 884 do CC) somado ao da solidariedade (art. 3º, I, CF) que justificavam a cobrança e o princípio da liberdade associativa (art. 5, XX, CF) para aqueles que defendiam o não pagamento.
Apesar disso, como dito, a questão foi definida pelo STF da seguinte forma:
"É inconstitucional a cobrança por parte de associação de taxa de manutenção e conservação de loteamento imobiliário urbano de proprietário não associado até o advento da lei 13.465/17 ou de anterior lei municipal que discipline a questão, a partir do qual se torna possível a cotização de proprietários de imóveis, titulares de direitos ou moradores em loteamentos de o controlado, desde que, i) já possuidores de lotes, tenham aderido ao ato constitutivo das entidades equiparadas a as de imóveis ou, (ii) no caso de novos adquirentes de lotes, o ato constitutivo da obrigação tenha sido registrado no competente registro de imóveis".
Está claro que, para antes da vigência da lei 13.465/17, ou antes de eventuais leis municipais tratando da questão, há necessidade de que os titulares de lotes "tenham aderido ao ato constitutivo das entidades equiparadas a as de imóveis", assim como está claro que para aquisições após a lei, basta que o ato constitutivo esteja registrado no competente registro de imóveis.
Aqui, abre-se um parêntese. Do voto do relator do referido tema se extrai: "... possibilidade de cotização entre os beneficiários das atividades desenvolvidas pelas associações, desde que assim previsto no ato constitutivo das organizações."; "...é necessário que a obrigação esteja disposta em ato constitutivo firmado após o advento da lei 13.465/17 (e que este esteja registrado na matrícula atinente ao loteamento no competente registro de imóveis, a fim de se assegurar a necessária publicidade ao ato)"; e "...vinculam tanto os já titulares de direitos sobre lotes que anuíram com a sua constituição quanto os novos adquirentes de imóveis em loteamentos como decorrência da publicidade conferida à obrigação averbada no registro do imóvel." - Ousamos dizer que o que se buscou na redação "o ato constitutivo da obrigação tenha sido registrado no competente registro de imóveis" seja a referência ao ato do registro do contrato padrão do loteamento ao qual atribua a obrigação ou ao registro do ato constitutivo das organizações, também do qual atribua a obrigação, que se dá, em verdade, no Cartório de Registro das Pessoas Jurídicas, que pode ser averbada no Cartório de Registro de Imóveis. Vemos que o que se buscou é a publicidade da existência da obrigação da cotização para manutenção dos objetivos sociais, que é o de istração, conservação, manutenção, disciplina de utilização e convivência, visando à valorização dos imóveis que compõem o empreendimento.
A maior celeuma está, sem dúvidas, para aqueles que já eram titulares de lotes nessas entidades antes do ingresso da referida legislação ao ordenamento jurídico.
Afinal, quando essa dita adesão pode ser considerada efetivada?
O art. 107 do Código Civil estabelece que, via de regra, a vontade pode ser manifestada livre de forma, inclusive pelo silêncio (art. 111, CC), a não ser que a própria lei exija de forma diversa.
Nos ensinamentos de Pedro Sack "Desta feita, sendo a manifestação de vontade, em regra, livre de forma, ela pode ser observada por todos os meios disponíveis na comunidade, podendo ser expressa (direta), tácita (indireta), verbal, escrita, mímica (sinais afirmativos ou negativos, apertos de mão etc.), atitudes, entre outros. Essa liberdade de forma possui perspectiva funcional, e não apenas de estrutura, pois sua utilização busca tutelar e fomentar os interesses merecedores de tutela na relação em análise, razão pela qual o intérprete deve se perguntar para que serve a forma no caso em debate. " (Sack, 2024).1
Temos, diante disso, que a adesão a associação gestora de loteamentos pode se dar das mais variadas formas, seguindo-se o entendimento do STF em seu Tema 492.
A primeira e mais natural é obviamente pela de termo de associação, onde o titular de lote manifesta diretamente o seu interesse em se associar.
Outra é aquela que consta do próprio contrato de aquisição do lote. Se dele constar a existência da associação para a manutenção do empreendimento, entendemos que a adesão se faz com a manifestação da vontade de aquisição da propriedade com essa condição.
Os operadores do direito podem buscar essa informação com o loteador, no Cartório de Registro de Imóveis por meio de microfilmagem se registrado ou, ainda, pelo pedido de inversão do ônus da prova previsto no § 2º do art. 373 do C para que o titular apresente o seu instrumento de aquisição, normalmente compromisso particular de compra e venda não levado a registro que, na maioria das vezes, possui cláusula de vinculação.
Temos, ainda, a associação por cláusula constante do contrato padrão, vinculado a matrícula do loteamento e depositado no CRI pelo loteador, que mesmo que não reproduzida em eventual instrumento de promessa de venda ou escritura, dada a sua publicidade pelo registro de imóveis, traz a certeza de que o titular, ao escolher a aquisição no empreendimento, aceitou sua condição de associado.
Por fim, a associação decorrente da aquisição de lote em loteamento no qual, embora ausente cláusula expressa no instrumento de compra e venda ou no contrato padrão, haja efetiva prestação de serviços por parte da associação. Nessa situação, impõe-se a demonstração inequívoca da efetiva fruição dos serviços prestados, da infraestrutura disponibilizada aos titulares e da ciência do adquirente, no momento da aquisição, acerca da existência e do funcionamento dessa estrutura associativa. Tal circunstância caracteriza adesão consciente à associação, na medida em que revela a anuência do adquirente quanto à contraprestação pelos serviços recebidos, cuja gratuidade não se presume.
Ademais, questiona-se, inclusive, a situação não abarcada pelo STF em sua tese fixada: a situação das próprias loteadoras, que, em regra, são as responsáveis pela criação da infraestrutura e dos serviços que são geridos pela associação, sendo, muitas vezes, também suas instituidoras, por força do contrato padrão registrado no Cartório de Registro de Imóveis
Nessa perspectiva, indaga-se se tais loteadoras, enquanto agentes originárias da estrutura e consequentemente dos serviços para sua manutenção, são associadas e se estariam sujeitas à obrigação de contribuir com as cotas associativas, na perspectiva do Tema e lei aqui tratadas.
Entendemos que a resposta é afirmativa. Não se pode itir que aquele que institui a obrigação dela se exima. Quem aufere o bônus deve arcar com o ônus.
As loteadoras, ao estruturarem loteamentos, instituem associações e estabelecem, no respectivo contrato padrão, a obrigação de pagamento das contribuições associativas delas destinadas à manutenção, conservação e istração das áreas de uso comum e a elas também se aplicam, enquanto titulares forem.
Essas constatações em face do titular ou morador, como descrito pelo Tema fixado, trazem a certeza de que a adesão pode ser manifestada por diversas formas e não somente por um termo descrito como "termo de adesão", ante a inexistência de solenidade para esse ato.
Conclui-se, portanto, que a fixação da tese no Tema 492 do STF, longe de inviabilizar a cobrança das contribuições associativas, estabelece critérios objetivos e coerentes com a ordem constitucional para sua exigibilidade, sobretudo a partir da lei 13.465/17. A multiplicidade de formas de adesão reafirma a vedação ao enriquecimento sem causa, especialmente quando evidenciada a fruição concreta dos serviços prestados pela associação.
A imposição do dever de contribuir às loteadoras enquanto titulares dos lotes também reforça o compromisso com a manutenção do empreendimento, sua valorização e o equilíbrio na distribuição dos encargos entre os beneficiários diretos da infraestrutura e dos serviços prestados.
Aos operadores do direito, resta agora fazer valer a lei e a interpretação dada ao Tema 492 do STF, aconselhando-se que as associações promovam o registro de seus estatutos e atos constitutivos, que os loteadores façam menção às associações no contrato padrão, e que as associações averbem sua existência na matrícula do loteamento no registro de imóveis, tudo com o objetivo de conferir a devida publicidade e vincular automaticamente os novos titulares, evitando-se toda a atividade probatória aqui discutida e assegurando plena adequação ao tema fixado pelo STF, em sua segunda parte: "(ii) no caso de novos adquirentes de lotes, o ato constitutivo da obrigação tenha sido registrado no competente registro de imóveis."
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1 SACK, Pedro. Pré-Textuais In: SACK, Pedro. A Interpretação do Silêncio no Negócio Jurídico - Ed. 2024. São Paulo (SP): Editora Revista dos Tribunais, 2024.
Fonte: Migalhas